Relatório final da
disciplina
A Cidade
Constitucional – Ano de 2009
Professor: Dr. Marcelo Arno Nerling
Aluno: Geraldo Otavio Milet Candido Freitas
– nº USP – 6774846
São Paulo
2012
No dia 05 de setembro de 2009 saiu da EACH um ônibus
com destino à Brasília, composto por professores - o idealizador do projeto,
caríssimo professor Marcelo Nerling, e também o professor de Gestão Ambiental
interessado por contribuir, professor Paulo Almeida - e estudantes de Gestão de
Políticas Públicas (GPP) e Gestão Ambiental (GA).
A viagem durara em torno de 24 horas, devido à uma
falha no motor do ônibus que ocorreu nas cercanias de Goiás, na cidade de
Catalão - Por sinal, cidade bela, de povo pacífico e sorridente; cheguei até a
me apaixonar por uma catalã, uma pena que era noiva!
Débora
Tomaziwski e Isabella Vallin frente à placa de Catalão.
Seguindo viagem, chegamos à Brasília e fomos direto à
ENAP – Escola Nacional de Administração Pública -, que, para um aluno de GPP,
aquilo é um sonho de consumo: Além de ser oficialmente o local de treinamento –
leia-se intermediário- que prepara um aprovado pelo concurso para o cargo de
Especialista de Políticas Públicas e Gestão Governamental, ali é rodeado de
pessoas que se interessam pela área pública, uma biblioteca que te faz repensar
se vale comer uma pizza ou comprar mais uma “delícia em folhas”, e também
possui um ótimo alojamento, o que faz do local uma “Ilha paradisíaca para os
amantes da coisa pública”.
Caiu a noite e conheci meu parceiro de quarto, Luiz
Felipe Sabino, que contou-me sobre toda a história de sua família e como eram
os coronéis na época de seu bisavô; foi um belo curso de FESB (Formação
Econômica e Social Brasileira) que tive com ele durante os dias e as noites
Brasilianas.
Luiz Felipe
Sabino, aproveitando os momentos em Brasília
Iniciando as visitas aos órgãos governamentais,
passamos pelo STF e também visitamos rapidamente o palácio do planalto, todavia,
ambos estavam fechados devido ao feriado nacional. Porém, neste dia 07 de
setembro fomos ao desfile oficial, aonde tive a alegria de ver as forças
armadas se apresentando – infelizmente não consegui ver o nosso ex-presidente
Lula-, e, para mim que sou um amante da cultura francesa, ainda que fosse o
nosso 07 de setembro, eu pude ver – juntamente com os colegas – a esquadrilha
da fumaça tecer o céu de vermelho, branco e azul, as cores da bandeira
francesa, em homenagem ao ano da França no Brasil. Para mim estava demais: o
povo brasileiro nas ruas, uma co-produção de elementos republicanos explícitos,
vangloriando a nossa história, e de brinde uma saudação à França! Fui no ano
certo à Brasília!
Bom, continuando o percurso, ainda neste dia tivemos
várias oportunidades de conhecer a urbanização de Brasília, tanto na passagem
pela rodoviária (um tanto turbulenta, talvez devido à festividade) quanto
rapidamente em frente à Catedral, o suficiente para nos encher de surpresa,
devido à sua beleza.
Pensar no planejamento urbano de Brasília, de forma
única e proposital, com as precisões das ruas e avenidas, é algo que só pode
ser feito estando lá, pois ao vislumbrar a magnitude que a cidade oferece sobre
você, a questão das “asas”, o distanciamento de um ponto ao outro, nos leva à
concluir que somente de automóvel pra poder cruzar a cidade, o bom é que o
transporte público é bem organizado.
Mais atividades! Pela primeira vez eu fui à uma
orquestra na minha vida, e vou lhes dizer: que coisa estupenda! Causa um efeito
sobre você, ainda mais se pensar que é algo “culto” e você está rodeado de
pessoas da USP... pelo menos era isso que eu pensava quando estava lá dentro,
por isso eu acho que influenciou mais ainda a minha avaliação acerca do que era
vivenciar um momento de orquestra.
Dia seguinte foi um dia bem cheio, pois, tivemos um encontro com o IPEA
para conhecermos como trabalhava-se a questão do planejamento econômico dentro
do cenário federal, além do fato de visitarmos posteriormente a responsável pela casa civil, que esteve em
posição de honra dentre a nossa consideração, pois, ainda que a visita tenha
sido curta, pudemos conhecer plenamente vários níveis de poderes dentro da
ordem executiva federal.
Ainda tivemos direito à visita ao museu do JK, que,
ao apreciar o acervo, permitia-nos sentir o reviver da história de um homem
ousado, assim como toda a trama que envolveu a sua vida. Quanto à museu, também
o museu da república, repleto de objetos que suplantaram os nossos primeiros
órgãos públicos de alto escalão – como é o caso da primeira mesa que o primeiro
Supremo Tribunal brasileiro utilizou-se - , a nossa primeira bandeira de
formato atual, roupas de Dom Pedro II e muitos outros apetrechos. Ainda que tal
museu fosse de porte pequeno, afirmo que é de grande valia uma visita
descompromissada ao mesmo ( tal museu fora visitado, salve engano, no último
dia de cidade constitucional, todavia faz-se mais palatável incluí-lo neste
bloco devido ao contexto).
No final de quase todas as noites íamos ás pizzarias
brasilienses... Caro leitor, se você programa uma visita à Brasília, por favor,
não se esqueça de visitar, pelo menos, uma pizzaria de lá: as pizzas são
servidamente recheadas, além de conter sabores antes não vistos num cardápio de
paulistano – como é o caso de jabá com girimum, carne com pêssego, dentre
outros -, elas, não sei atualmente, mas em 2009 costumavam ser de bom preço
(por volta de 15 reais), com equipe muito simpática, onde até mesmo o próprio
gerente vinha às mesas para fazer alguma brincadeira bonachona, porém de muito
bom grado. Esta fora uma parte extasiante à todo “Cidadeconstitucionalista”, se
assim posso nos chamar.
3. Uma lição que marcou a minha vida
Agora entrarei num feito que marcou mais do que tudo na minha viagem ao
Cidade Constitucional, pois ainda que falte contar-lhes acerca do Sr. Abramovay
no Palácio da Justiça, de nossa visita à camara dos deputados onde pudemos
participar de uma
Dia do julgamento de Cesare Batisti
sessão que, ainda que mirrada, fora de muita afeição
para nós ao sermos citados ao vivo, e também do italianão Cesare Battisti que estava sendo julgado
pelo STF neste mesmo dia ( o 3º), o que irei relatar trata-se de um aprendizado
valorativo que, por ocasião do destino eu viria a vivenciar e, passando da
vergonha à correção, hoje tomo como uma disciplina para mim e creio ter
afeiçoado à minha maneira de viver. Voilà,
não vou deixá-los mais curiosos acerca do que é.
Pra quem não sabe, eu
entrei no curso de GPP com uma única intenção que era a de me tornar um bom
gestor público para seguir carreira política. A política, naqueles primeiros
meses, corria em minhas veias quase rasgando a carne, era algo doce, palatável,
que eu sonhava e buscava saber cada vez mais acerca de políticos que
desempenhavam mudanças significativas na vida de pessoas.
Eu e meus
colegas, na primeira vez que sentei numa tribuna num órgão público
Pois bem, nessa situação de conhecer gente da
área, saber como é o cotidiano dos eleitos e tudo o mais que cerca a vida do
mesmo, eu, por contato de uma amiga, fui apresentado ao até então presidente
nacional da juventude do PMDB... caro leitor, aquilo pra mim era tão
resplandescente quanto se eu soubesse que naquele instante que havia ouro no
quintal de casa, era algo mais do que novo pra mim, e que eu busquei ter tanto
cuidado, mas tanto cuidado com aquele contato que eu nem mesmo conhecia, que
cheguei a perder por algumas horas a atenção acerca das atividades da Cidade
Constitucional. Bem, vejamos aonde isso daria:
Contato intermediado
pela amiga, faltava agora uma oportunidade de conhecê-lo; ele ficava na câmara
dos deputados, num desses gabinetes escondidos por lá, mas... como eu iria
chegar lá se nem ao menos visita teríamos antes do dia 10? E eu queria muito conhecê-lo, por mim,
naquele instante! Pois bem, pensei: “Vou arriscar, vou sair de uma das
atividades, pegar um taxi ou coisa do tipo e vou até lá, vai ser rapidinho e
nem vai dar tempo de darem por falta de mim”. E lá se foi o Milet, escolhi uma
das visitas para não ir, calculei 2h para fazer a visita, no horário do almoço,
peguei um taxi – o esfolou umas notas de mim mas não tinha problema, eu iria
conhecer um cara importante e com hora marcada só pra mim!
Cheguei ao tal do gabinete
e fui recebido no tempo esperado, tomei um capuccinno feito em maquina expressa
servido pela mão do próprio senhor Salazar – o tal presidente da juventude – e
conversamos por uns bons minutos, ele me falou acerca da participação da
juventude na política, jogou mais ainda minhas esperanças para as alturas, me
deu um monte de dicas; fui grato a ele por ter-me recebido e saí, como quem dá
o primeiro beijo de sua vida, quase flutuando pelos corredores... Horas? 1 e
meia. Caí no chão de novo, dei por conta que 2h teríamos que estar em frente ao
Itamarati - salve engano – e saí agora correndo por aqueles, até então belos,
mas agora intermináveis corredores e escadarias; corri, corri, corri e nada de
achar um taxi na rua, até que uns 15 minutos depois me surge um bom taxista que
me levaria até o local que eu precisava ir. 2 e 15 +- eu cheguei, e, sim,
estava parado o ônibus da USP, alguns alunos por lá e tudo mais, só que, quando
me viram tomaram um susto: Benjamin, Benjamin, aonde vocês estava??? Procuramos
por você por várias horas e nada!
Caraca.... eu havia me
esquecido de avisar alguém que eu iria sair, e se tem algo que me deixa
chateado e saber que fiz com que outras pessoas perdessem de alguma forma o seu
tempo por mim... lá estava eu, com cara de pastel em frente a todo mundo, e
mais, querendo uma explicação. Dei a explicação, fui sincero, falei que saí por
conta pra visitar um amigo, que não precisavam se preocupar; bom, a turma
entendeu, porém, um único homem chegou em minha direção com um olhar que estava
mais afiado do que a espada do próprio Thundercats pegando fogo; era o
professor Nerling.
- “Geraldo, aonde
estava? Estávamos todos lhe procurando”
- “Recebi um convite
professor, fui visitar um homem que trabalha com política aqui em Brasília, porém
cheguei na hora marcada da visita”
-“Geraldo, achamos que
você estava perdido em algum lugar que fora visitar, ligamos para vários locais
perguntando por você, foi algo preocupante para mim que sou o responsável por
vocês em Brasília.
Quanto a você visitar alguém da área da política eu acho
interessante, todavia de forma alguma da maneira com que fez”
-“Perdoe-me professor,
eu não tive a intenção; apenas achei que eu poderia aproveitar algo
interessante que surgiu inesperadamente pra mim aqui em Brasília”
-“Imagino mesmo que
tenha sido muito interessante Geraldo, todavia, se era tão interessante assim,
porque então não pensaste em teus amigos? Porque você não os convidou para
vivenciar tal atividade tão importante contigo? Você não teve algo que é importantíssimo
para qualquer gestor público que merece sua devida posição, faltou-lhe a visão
do gestor”
Não havia mais nada a
ser dito. Agradeci e retirei-me, um tanto chateado com o que tinha feito e
pensando nas palavras do professor.
Depois disso, tudo seguiu em ritmo normal;
participei de todas as outras atividades que havia comentado anteriormente, e,
durante a noite do mesmo dia busquei re-encontrar o professor Nerling e
consegui, agora porém em ritmo muito mais calmo, onde pudemos trocar mais
palavras e pude compreender o quanto um aluno para ele era importante, e, pelo
incrível que pareça, o aluno em si, como vida, como quem era, também era na
mesma medida importante. Nos entendemos, nos abraçamos e continuamos a jornada.
Ainda assim as palavras do professor Nerling não me saíam da cabeça e realmente
decidi decodificá-las para entender o que era ter essa tal “Visão do Gestor”.
Hoje tenho uma gratidão
tremenda a Marcelo Arno Nerling por ter-me dito aquelas palavras naquele exato
momento. É possível que qualquer pessoa tenha a visão do gestor e não
necessariamente seja um gestor declarado de alguma coisa, todavia, não é
possível que um gestor, ainda mais de políticas públicas, não tenha a visão do
gestor. A visão do gestor é a capacidade que um indivíduo tem de colocar-se
numa situação em que ele em questão está envolvido em uma malha de outros
indivíduos, que tal interconexão se move plurilateralmente se ele próprio se
mover, como a tenda de um circo que se movimenta com o simples movimento de uma
de suas estacas. Portanto, quando este indivíduo faz parte de um todo, cada
movimento dele influencia diretamente a vida de outros indivíduos, tanto para
bem quanto para mal, o mesmo ainda, se tiver capacidade, pode mover toda a
malha ao levar o grupo à situações que o próprio julga - de maneira egoísta –
serem boas ou ruins, o que, incrementalmente, muda SIM a vida de cada um.
Eis aquele
que ensina com sabedoria.
Sou grato professor, por
ter-me ensinado algo tão significante para a minha vida, sei que já fora
repassado, e outras vidas estão, cada qual da sua forma e no seu tempo, ruminando
em suas mentes a visão do gestor.
Voltamos, nos despedimos
e aqui estou, no 8º semestre de Gestão de Políticas Públicas, recuperando de um
acidente e lutando para ser digno daquilo que eu tenho em minhas mãos.
Um abraço do Benjamin,
Geraldo Milet.
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